Friday, February 23, 2007

Venham Mais Cinco

Zeca Afonso morreu há vinte anos. Muitos o recordarão pelo símbolo. A Grândola. As campanhas de alfabetização. O homem de esquerda. Livre pensador e vertical.

Eu recordo-o como o grande músico que foi. Poeta, compositor e etnomusicólogo, que tão bem soube ir às raízes da música popular para nos oferecer baladas inesquecíveis.

Zeca era também um homem de Coimbra. Bicho-cantor chamavam-lhe. Bicho era como os universitários apelidavam os alunos do secundário. Cantor por já nessa altura, depois de se cruzar com António Portugal e Luis Goes a sua voz ecoava pela cidade velha. Percorreu as Républicas, jogou futebol na Briosa, participou em serenatas. Integrou a Tuna e o Orfeão de Coimbra. O fado de Coimbra lírico e tradicional era superiormente interpretado por si.

Em 1958 grava o primeiro disco. “Baladas de Coimbra”. Sendo professor correu o País. Mangualde, Aljustrel, Lagos, Moçambique, Setúbal. Mais tarde grava “Os Vampiros” que com “Trovas do Vento que Passa” de Adriano se tornam hinos. Em 68 grava “Cantares do Andarilho” e em 70 “Trás Outro Amigo Também”. No início dos anos 70 atravessa a sua fase de maior criatividade publicando álbuns antológicos: “Cantigas do Maio” em 71, “Eu vou ser como a Toupeira” e “Venham Mais Cinco” em 1973.

“Venham mais cinco” foi sempre o meu disco preferido do Zeca. Primeiro em vinyl, e depois numa edição em CD da Movieplay com um excelente livro a acompanhá-lo.

Gravado em Paris sob direcção de josé Mário branco, inclui pérolas como “A Formiga no Carreiro” ou “Rio largo de profundis”. Baladas como “Que o amor não me engana”, ironias como “Gastão era perfeito” ou “nefetite não tinha papeira”. E o genial

“Venham Mais Cinco”. duma assentada que eu pago já
Do branco ou tinto, se o velho estica eu fico por cá
Se tem má pinta, dá-lhe um apito e põe-no a andar
De espada à cinta, já crê que é rei d’aquém e além-mar

E o irresistivel “tiriririri buririririri, Tiriririri paraburibaie”.

No início dos 80 adoece gravemente, e é já doente que dá os Concertos do Coliseu. Com os homens que tantas vezes gravaram com ele em palco. Júlio Pereira, Fausto, Vitorino e Janita Salomé. Tive o prazer de assistir ao do Coliseu do Porto. Foi arrepiante. Com a plateia em uníssono a acompanhar um Zeca já traído pela voz. Desse concerto nasceu um CD, à venda na FNAC.




Em 94 em sua homenagem é publicado um CD fabuloso “Filhos da Madrugada” com fabulosas versões por grupos como os Madredeus, GNR, Xutos, Delfins ou Resistência.

Para assinalar os 20 anos sobre a morte de Zeca Afonso é esta semana lançada a colectânea "José Afonso" que integra 30 temas, divididos em dois destacando-se temas como "Canção de Embalar", "Canto Moço", "Milho Verde", "Maio, Maduro Maio" e o inevitável "Grândola, Vila Morena", entre muitos outros. Na FNAC, € 16.

Para recordar o melhor Zeca. E para os mais novos o descobrirem.



E um blog dedicado ao Zeca.

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