Tuesday, March 06, 2007

DVDteca (21) Grandes Mestres do Cinema

Joseph L. Mankiewicz ("All About Eve"/"Cleopatra"/"Julius Caesar") fez o argumento, realizou e produziu este melodrama encantador sobre o stablishment (o “sistema”) de Holywood filmado na Riviera. O filme começa em Rapallo, com o funeral da heroína que gostava de caminhar descalça. Maria Vargas (Maria D'Amata, nome artístico) que seis meses antes se tornara condessa pelo casamento com o Conde Torlato-Favrini, depois de simples bailarina de flamenco, ter ascendido a estrela de Holywood,. No funeral está Harry Dawes (Humphrey Bogart), realizador dos três filmes de amria, na sua efémera carreira



O filme parte então num flashback guiado por um cínico Harry, brilhante realizador ex-alcoólico que relançara a carreira com Maria, que nos narra a história desde o tempo em que trabalhava para o magnata Kirk Edwards (inspirado em Howard Hughes, com quem Ava Gardner tivera um caso que a ajudou no ínicio da carreira). Kirk leva Harry, a sua companheira Myrna (Mari Aldon) e o nebuloso assessor de imprensa Oscar Muldoon (Edmond O'Brien, que ganharia o Óscar de melhor actor)) a um cabaret de flamenco para convidar Maria a fazer um casting em Roma. Maria recusa até reconhecer Harry, que admira pelos seus filmes, e faz depender a sua aceitação de ser dirigida por ele.


Torna-se uma grande estrela mas depois dos três filmes rompe o contrato com Kirk e foge com Alberto Bravano, playboy milionário sul americano, que vem jogar para a Cote d’Azur. O romance acaba numa mesa de jogo quando Bravano acusa Maria de o ter feito perder ao jogo. Quem defende a honra da dama e como cavalheiro da aristocracia italiana dá uma estalada no vilão é Vincenzo Torlato-Favrini. Que logo convida a actriz a passar uns dias na sua villa. Acabam por casar, mas o Conde confessa ser impotente por uma ferimento de guerra. Maria percebe que o Conde quer continuar a linhagem e tenta engravidar sem nada contar ao marido. Que, num acesso de ciúme, a mata e ao motorista quando os vê juntos.


Este argumento, que daria uma boa novela mexicana, nas mãos de Manckiewicz dá um filme excepcional, pela qualidade dos diálogos, cenários sumptuosos e a ausência de moral em que os bons da fita morrem ou saem tristes, e os maus da fita seguem em frente. E o fabuloso trabalho dos actores,claro. Aliado à densidade dos personagens, desde os quase paternal mas cínico Dawes ao sinuoso e ambíguo Muldoon, homem de mão do estúdio. E o papel da heroína, inspirado em Rita Hayworth e a sua relação com o Príncipe Aga Khan. Que Claude Chabrol caracterizou como "... perfeitamente interpretado pela bela Ava. Frígida com os libertinos, ninfomaníaca com os puritanos, ela é tudo o que o público não é. E mais do que isso é tudo o que les nunca terão. Esta Beleza transformada em estátua descalça escapa-lhes. No final não pretence a ninguém excepto talvez ao homem que a quer proteger sem a querer possuir: Mankiewicz, disfarçado do personagem de Bogart”.


As cenas finais do filme deram brado na época ao romperem com o "Hollywood’Production Code”. Maria passando dos braços de um homem para o outro, a infidelidade e a gravidez fora do casamento e crime passional eram temas que os estúdios não gostavam de ver nos seus filmes. Dele escreveu Francois Truffaut "Filme súbtil e inteligente, bem realizado, com excelentes actors, o melhor filme que anda por aí”. E Ava dele disse ter sido "o apogeu da minha vida como estrela" . Ela que nascera também “descalça” e descoberta por caçadores de talentos assinaria com a MGM em 1941, aos 18 anos. Logo casou com Mickey Rooney e iniciou a motanha russa de uma carreira em Hollywood À chegada a Roma acabara de deixar o seu terceiro marido, o grande amor da sua vida, Frank SInatra. O que esfriou a sua relação com Bogart, amigo de Sinatra, que não via com bons olhos o affair que Ava tinha com Dominguin, o matador espanhol. Curioso romance este já que Ava não falava castelhano nem Dominguin inglês.


Mankiewicz vencera antes o Óscar de melhor realizador e argumento com “A Letter to Three Wives” e “All About Eve” (1950) e foi o último grande ralizador na carreira de Bogart que aqui chega já acossado pela tosse e o cancro. Mankiewicz dele diria, "Bogie was the iconoclast in a society that dealt in icons, which is Hollywood. The cynicism that the part required was his by nature. When you've been through the Hollywood mill, you've been through the mill of mills".


Manckiewicz licenciou-se em Medicina em Columbia e especializou-se em Psiquiatria. O que nos faz perceber o primado das motivações das personagens sobre o enredo nos seus filmes. E que nos seus filmes tenha criado um género, o Théatre du filme, que dá igual atenção ao verbal, visual e ao humano, esculpindo e entrelaçando os três elementos em sinergia, para potenciar o seu impacto. Os seus personagens tomam decisões que determinam acções que levam a novas escolhas que acabam em confrontação. Assim foi em “The Quiet American”(1958), nos camarins de “All About Eve” ou na sala de estar suburbana de “A Letter to Three Wives”, ou numa mansão misteriosa em “Sleuth”(1972) ou num trono Egípcio em “Cleópatra”(1963). Os seus filmes são filmes dentro do filme, focados no amago dos seus persionagens, com uma realização que enfatiza e complementa essa interioridade

Cleopatra é o esplendor do seu cinema, um épico, género não notório pela complexidade dos personagens, centrado numa mulher e o seu poder, Cleopatra (Elizabeth Taylor) desde a sua coroação ao modo como pede a Julio César (Rex Harrison) para cumprir o sonho de Alexandre. E no final nega a Octávio a sua vitória suicidando-se e oredenando aos seus servos que a preparem, controlando a sua imagem e não se deixando possuir por ninguém, especialmente um homem. Outro grande filme é “Júlio César”(1953) em que César (Louis Calhern) e Brutus (John Hoyt) ignoram os avisos de Portia (Deborah Kerr) sobre os conspiradores que manipulam as massas, como Cassius (John Gielgud), que acaba por levar Brutus para o seu lado. A tragédia de Brutus resulta da sedução de Cassius, e por não ouvir António. Em”Suddenly, Last Summer”(1959), Catherine Holly (Elizabeth Taylor) é a parente pore convidada pelo primo Sebastian para com ele viajar e servir de isco aos jovens que ele própro deseja.Depois de assistir à morte do primo, canibalizado pelos jovens que tentara seduzir, Catherine entra em depressão. Segue-se a luta entre a sua mãe e a tia (Katherine Hepburn) que quer ver Catherine lobotomizada para assim enterrar o segredo da tragédia do filho.

Mankiewicz foi um realizador proto-pósmoderno ao antecipar tantas ideias, estéticas, sociais ou filosóficas que se tornarem proeminebtes neste dealbar de século. Noutro aspecto, porém, foi conservador. Ao centrar a sua arte na condição humana, da qual sempre foi um astuto observador. Como dizia um dos seus personagens “I am a critic and commentator. I am essential to the theatre.” Mankiewicz também o era, mas da sociedade e os seus filmes fram o veículo dassuas análises. Como ele dizia: "I do not believe that composition is the magic password and the ultimate that cinema can attain. In my opinion, it is much rather the intellectual depth, the deep truth of the intellectual description, the content, that matter."

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